sexta-feira, 15 de março de 2013

A Eternidade - Arthur Rimbaud


The Ninth Wave - Ivan Aivazovsky - 1850

De novo me invade.
Quem? – A Eternidade.
É o mar que se vai
Como o sol que cai.


Alma sentinela,
Ensina-me o jogo
Da noite que gela
E do dia em fogo.


Das lides humanas,
Das palmas e vaias,
Já te desenganas
E no ar te espraias.


De outra nenhuma,
Brasas de cetim,
O Dever se esfuma
Sem dizer: enfim.


Lá não há esperança
E não há futuro.
Ciência e paciência,
Suplício seguro.


De novo me invade.
Quem? – A Eternidade.
É o mar que se vai
Com o sol que cai. 


Tradução: Augusto de Campos

quinta-feira, 14 de março de 2013

Gênio - Arthur Rimbaud


The Black Sea At Night -1879 - Ivan Aivazovski

Ele é a afeição e o presente, pois fez a casa aberta ao inverno espumoso e ao rumor do verão, ele que purificou as bebidas e os alimentos, ele que é o encanto dos lugares fugitivos e a delicia sobre-humana das estações. Ele é a afeição e o futuro, a força e o amor que nós, em pé sobre os ódios e os desgostos, vemos passar no céu de tempestade e nos estandartes de êxtase.

Ele é o amor, medida perfeita e reinventada, razão maravilhosa e imprevista, e eternidade: máquina amada das qualidades fatais. Tivemos todo o espanto de sua concessão e da nossa: ó fruição de nossa saúde, impulso de nossas faculdades, afeição egoísta e paixão por ele, ele que nos ama em razão de sua vida infinita...

E nós o evocamos e ele viaja... E se a Adoração vai embora, sua promessa ressoa: “Para trás estas superstições, estes corpos antigos, estas famílias e idades. É esta a época que soçobrou!”

Ele não irá embora, não tornará a descer de um céu, não cumprirá a redenção das cóleras das mulheres e das alegrias dos homens e de todo este pecado; porque isto foi feito, ele existindo, e sendo amado.

Ó suas respirações, suas cabeças, suas progressões; a terrível celeridade da perfeição das formas e da ação!

Ó fecundidade do espírito e imensidão do universo!

Seu corpo! O desprendimento sonhado, o quebrantamento da graça perpassada por violência nova!

Seu olhar, seu olhar! Todas as genuflexões antigas e as penas redimidas após sua passagem.

Seu dia! A abolição de todos os sofrimentos sonoros e móveis na mais intensa música.

Seu passo! As migrações mais enormes que as antigas invasões.

Ó ele e nós! O orgulho mais benévolo que as caridades perdidas.

Ó mundo! E o canto claro dos novos flagelos!

Ele nos conheceu a todos e a todos nos amou. Saibamos, nesta noite de inverno, de cabo em cabo, do pólo tumultuoso ao castelo, da multidão à praia, de olhares em olhares, forças e sentimentos cansados, chamá-lo e vê-lo, e despedi-lo, e sob as marés e no alto dos desertos de neve, seguir suas visões, seus alentos, seu corpo, sua luz.